Há uns anos, trabalhando em Marrocos, conhecim a Khadija Riady, a primeira mulher presidenta da AMDH (Asociaçom Marroquina de Dereitos Humanos) e hoje coordenadora da Marcha Mundial das Mulheres no Maghreb. Assistim a umha conferência sua sobre a situaçom actual das mulheres em Marrocos, que me achegou umha complexa e poliédrica visom de conjunto, fora de posturas maniqueas e de manidos estereotipes.

Comecemos por falar de Al Moudawana ou chamado Código de família, escrito no S. VIII por um Imám da cidade de Medina (Arábia Saudi), onde recolhe os comentários feitos a umha colecçom de ditos do profeta Maomé sobre o matrimónio, a poligamia, a herdança ou a custodia das crianças. Este Código, promulgado e aplicado após a independência de Marrocos (1956), vem sendo o único texto legislativo do país baseado na religiom islâmica; as demais normas legais, que fixam as normas de conduta das mulheres, tenhem umha base laica de grande influência francesa. Estamos, já que logo, diante dum texto com grandes eivas no tocante à igualdade de direitos cos homes e claramente discriminatório.

A pesares de viver num estado de submetimento grande, sabemos de mulheres que desde há séculos se rebelárom diante desta situaçom. Porém, só será a partir dos anos 70 quando podamos falar dum movimento feminista amplo e diverso, quer desde posiçons ateas e de esquerda, quer a partir de novas formulaçons vinculadas ao islamismo popular. Por isso nom é de estranhar que, mália as dificuldades, houvesse avances como o feito de que Marrocos ratificasse (1993) com algumhas reservas a “Convençom para a eliminaçom de todas as formas de discriminaçom contra a mulher” (CEDAW), ou que o Parlamento marroquino aprovasse (2004) e o rei Mohamed VI, máxima autoridade civil e religiosa, dera o seu consentimento a importantes reformas do devandito Código Al Moudawana, melhorando e ampliando alguns direitos das mulheres. Falamos, por exemplo, da corresponsabilidade diante dos assuntos familiares, do fim da obediência da mulher ao homem, da nom necessidade dum tutor para poder contrair matrimonio, da autorizaçom de casamentos com pessoas nom muçulmanas, de nom casar antes dos 18 anos, de nom poder ser repudiada sem a autorizaçom dum juíz, de presentar demanda de divórcio ao igual que os homens, de ter direito a umha vivenda e a pensom alimentar umha vez divorciada e com crianças ao seu cargo, etc.

Nom obstante, a resistência a estes avances segue a ser forte: uns 40.000 casamentos ao ano (o 10% do total) som realizadas com menores de 18 anos, sobre todo nas zonas rurais; na prática, nom está garantido o direito a casar com umha pessoa nom muçulmana; a tutela das crianças segue a ser maioritariamente concedida aos pais; a poligamia nom está abolida, simplesmente limitada à “autorizaçom da mulher” e sempre que o homem tenha recursos para manter varias famílias; as mulheres seguem a herdar a metade que os homens; a corresponsabilidade das obrigas familiares nom está sendo efetiva, etc.

No Código Penal a norma também atenta contra os direitos das mulheres e contra a igualdade, quando a sançom por violaçom depende de se a mulher está casada ou nom, ou de se ainda é virgem. O aborto é ilegal e nom está permitido nengum suposto, nem por violaçom, nem por incesto. Ademais, as relaçons consentidas fora do matrimónio estám penalizadas com um ano de cárcere e, no caso de homosexualidade, com até três anos.

Quanto à situaçom laboral, na teoria nom se pode discriminar por questom de género e existem direitos específicos para as mulheres como os permissos de maternidade e a condena do acosso laboral, mas na prática só umha pequena percentagem de empresários (um 15%) respeitam estas leis.

As cifras que nos dam a conhecer a realidade socio-política do Reino alaouita, falam por si sós sobre a situaçom das mulheres: mais dum 50% de analfabetismo feminino e um 70% no rural; mais do 60% das mulheres sofrérom algum tipo de violência sexual e só denunciam um 10% delas; a taxa de atividade laboral feminina nom chega ao 30%, quando em Europa é dum 50%; a taxa de mortalidade nos partos é de 127/100.000 mulheres; mais de 60.000 raparigas menores de 18 anos trabalham de domésticas nas casas; em Marrocos registam-se de 500 a 800 de abortos e umha média de 24 bebés abandonados cada dia….

A pesar de que com todos estes dados semelha que os direitos e liberdades das mulheres em Marrocos sejam inexistentes, algo está mudando cara a umha sociedade mais igualitária; algo que vem de atrás e que co passo do tempo e com mais apoios, deverá-se enfrentar a um futuro incerto, mas com perspetivas de melhora tais como debruçar-se no ensino e formar a gente moça dum jeito verdadeiramente coeducativo; dar prioridade à questom de género em todos os âmbitos da vida social e política; procurar a colaboraçom dum segmento de homens progressistas para ampliar as liberdades públicas e atingir canles de participaçom para a sociedade civil….

Mulheres com gram presença na esfera pública como a escritora Fatima Mernissi, falecida em 2015, Leila Slimani, premio Goncourt 2017, valedora da liberdade sexual das mulheres, ou Ibtissam Lachgar defensora dos direitos LGTB; coletivos como Associatiom Démocratique des Femmes du Marroc, Forum de Femmes au Rif; ou 100% Mamans, que oferece ajuda e formaçom a nais solteiras, a carom doutras vozes ou entidades, formam parte dum clamor a prol dos direitos das mulheres que percorre as ruas de Marrocos nos últimos anos, apoiado por amplas capas da populaçom. Mália que todo transcorre dum jeito mais lento do que tod@s quigéssemos.