Em tempos de debalo mobilizador, o movimento feminista leva demonstrando umha capacidade de arraste importantíssima, enchendo as ruas de consignas pola igualdade real, e incorporando à luita social e política novas geraçons de moças. Mas como pano de fundo do sucesso -representado pola greve feminista de inícios de ano-, o patriarcado mais duro reorganiza-se em prática e discurso. A extrema direita emergente agita a bandeira ‘contra a ditadura de género’, nos seus termos invertidos, e a justiça e a mídia continuam a afundar em pautas contrárias aos direitos das mulheres.

Pola vez primeira na história da democracia monárquica espanhola, um partido congrega multidons clamando contra o avanço das mulheres, e pedindo a derogaçom da Lei de Violência de Género, com catorze anos de vida. Lobbies ultras de homens maltratadores, grupos em favor da custódia para agressores, intelectuais neofranquistas, povoam as redes com esta linha discursiva. Umha tentativa desesperada de maquilhar umha realidade mais do que evidente: 95% das pessoas condenadas por violência de género som homens, e o 100% dos agressores sexuais pertencem ao género masculino. E por trás dos dados mais gritantes acham-se as milhons e pequenas agressons e aldragens diárias que atopam as mulheres.

Na Galiza do passado ano, se atendermos apenas às denúncias e obviamos as nom contabilizadas, fôrom 6537 as agressons contra mulheres. Segundo estimaçons oficiais de 2017, no nosso país, de cada 10000 mulheres, 47 som vítimas da violência mais explícita por parte dos homens. Ao que parece, as condutas agressivas ainda se intensificam em menores de idade, como produto da exposiçom incontrolada dos moços a conteúdos patriarcais virtuais.

Justiça patriarcal, no alvo o 25 de Novembro

Com a legenda ‘Se é patriarcal, nom é justiça’, o movimento feminista convoca concentraçons em trinta localidades da Galiza, nas que se incluem vilas como A Gudinha ou Burela, e obviamente as grandes cidades. Demonstrado de sobra o seu poder mobilizador, desta volta resta por ver se a pressom das ruas consegue pôr umha barreira a umha judicatura muitas vezes transigente com as agressons machistas. O caso mediático da chamada ‘La Manada’ deitara luz sobre a conduta desprezativa, paternalista e incrédula que os homens empoleirados em posiçom de poder mantenhem sobre a mulher, quando se submeteu a exame a conduta privada dumha mulher e se amossárom dúvidas de se fora realmente violada.

Mobilizaçom feminista em Compostela. Imagem: wikipedia

O patriarcado, também umha questom de classe

A dureza do patriarcado fai-se crescente a medida em que ponhemos o foco em mulheres mais vulneráveis, pertencentes à classe obreira, sem redes sociais de apoio, sem transcendência mediática , e muitas vezes procedentes de países foráneos. Eis o transfundo do discurso do sindicato nacionalista CIG, que nesta manhá lançou concentraçons diante de vários concelhos galegos. Com a legenda ‘A precarizaçom do trabalho de cuidados é violência machista’, a CIG sulinhou que a mulher carrega com o maior peso da exploraçom capitalista, nomeadamente no trabalho de cuidados. Desde que as tarefas de reproduçom da vida passárom à esfera mercantil, as instituiçons apostárom por externalizar serviços, ponhendo em andamento um sector produtivo totalmente feminizado, dominado pola precariedade, e em muitos casos por tratos abusivos e degradantes de homens a mulheres. Todo um leque de ‘empregos considerados de segunda’ -apesar da sua importáncia social-, em que as mulheres por vezes nom recebem o SMI, desenvolvem tarefas para as que nom foram contratadas, e enfrentam graves problemas de conciliaçom e acossa.

Os cuidados, sempre feminizados e em condiçons de exploraçom

A CIG manifesta que estes problemas som especialmente palpáveis em centros de cida, serviços de ajuda ao lar, residências, escolas infantis e trabalhos de limpeza. Como declarou numha entrevista Mireia Saiz, do Centro Assessor de Mulheres ‘Argilan’, do País Basco, é neste sector laboral onde se produzem a maior parte de casos das chamadas ‘violaçons em silêncio’. Nutrido por imigrantes sem contorno social, com problemas de integraçom laboral, e em muitos casos sem direitos reconhecidos, as mulheres estám colocadas numha perigosa indefensom.

O morbo, aliado do patriarcado

Além do laboral, o jornalismo de ínfima qualidade, empenhado em vender informaçom barata e de péssima qualidade, também está a jogar um forte papel como barreira à implantaçom definitiva do movimento feminista. Mergulhado até o pescoço na recriaçom truculenta de assassinatos de mulheres -com o caso de Diana Quer em primeiro plano de atualidade-, o pouso informativo das suas novas nom é inocente. Recentemente, o jornal ‘El Salto’ dava voz ao colectivo de Jornalistas Galegas, que apontava como o tratamento informativo do assassinato patriarcal tenciona sempre desculpabilizar o sistema: “dam argumentos que acabam justificando a violência machista: foi um arrebato, um desengano, virou louco…nom se deixa claro que a única causa destes crimes é umha violência estrutural e sistemática contra as mulheres.” Com motivo do triple assassinato de Valga, onde três mulheres caírom vítimas das balas dum homem, colectivos como Defende A Galega e o Colégio Profissional de Jornalistas da Galiza, denunciárom o tratamento indigno e morboso do meio público.

No nosso portal, a militante Maria Osório analisava recentemente como o caso do crime de Diana Quer está a ser utilizado como forma de recriaçom do medo paralisante contra as mulheres, que em troca de enfrentarem um inimigo sistémico -o sistema patriarcal e os seus códigos- tenhem que andar permanentemente à espreita frente à figura do homem tolo, desquiciado, que pode irromper em qualquer recanto. A investigadora Nerea Barjola partiu deste quadro de análise para entender como o morboso ‘caso Alcásser’ foi utilizado para disciplinar as mulheres na década de 90, chamando à sua auto-inibiçom ante o terror patriarcal, e tentando-as a ficarem na morada para ‘evitarem perigos’.

Nerea Barjola, umha das investigadoras que analisou o discurso do terror como meio de
disciplinamento da mulher. Imagem: argia.eus

Patriarcado reage

Ao contrário que na década de 90, nom é o patriarcado quem toma a inciativa, senom o feminismo, movimento que alcançou dimensom de massas e umha condiçom transversal a classes e ideologias. Porém, isto nom arreda o perigo para as mulheres (e os homens) que defendem um mundo igualitário. O movimento pode virar mais um dispositivo institucional para canalizar o protesto; por outra parte, ante o avanço das mulheres, quer a extrema direita organizada, quer milhares de homens desesperados que acreditam no direito a oprimirem à mulher, podem lançar umha ofensiva redobrada.