Nos últimos anos fala-se com relativa frequência, e exponencialmente mais do que anos atrás, da regueifa: da sua recuperaçom e ampliaçom de espaços institucionais e militantes, dxs novxs regueifeirxs e pluralidade de discursos e até da renovaçom que todo isto está a provocar neste reduzido sistema.

Dos movimentos sociais interessaria-nos olhar para algumhas das mudanças que no campo da regueifa se estám a dar no nível discursivo, de referentes performativos e de possibilidades para a açom política. Por dizer doutro modo, repararmos em como alguns grupos do (também diverso) antagonismo político estám a criar contra-espaços públicos a partir dumha ferramenta como a improvisaçom oral, que se bem estava disponível na tradiçom galega tinha desativados alguns dos seus componentes mais subversivos. A regueifa está a ser hoje utilizada como ferramenta para a transformaçom social, e nom apenas como umha representaçom tradicionalista nem umha atividade de criaçom artística restrita, quase mágica e aparentemente autónoma de qualquer outro campo. Parece que neste sentido, o bertsolarismo, o movimento arredor da improvisaçom oral basca, pode ser referencial para entendermos a importância de construir a relaçom desde os movimentos de base (o independentismo, os espaços autónomos, os feminismos…), resignificando a tradiçom oral e aproveitando-se da sua popularidade entre a comunidade.

É interessante darmos a atençom necessária a esta possibilidade repertorial que já está a ser aproveitada nalguns espaços do ativismo e que vou chamar ‘regueifa antagonista’. Os seus modos de fazer, os espaços em que é concebida esta regueifa e as encenaçons que acompanham a improvisaçom destes contra-espaços públicos, inevitavelmente marcados pola conflituosidade do heterogéneo e a institucionalizaçom precária ou completamente ausente. Os obradoiros de ‘regueifa feminista’ ministrados em centros sociais e licéus por algumhas das mais novas regueifeiras, ou os Encontros de Mulheres Repentistas da Galiza, realizados anualmente desde 2017, som um exemplo do aproveitamento desta ferramenta por parte dos feminismos.

É também, a antagonista, umha regueifa com relativa autonomia dos campos de poder e vinculada a umha oposiçom dos valores artísticos e políticos hegemónicos, que carateriza às agentes participantes dum habitus mais próprio de ativistas que de artistas, com capitais e reconhecimentos adquiridos nesses mesmos espaços contra-hegemónicos. Teremos de acrescentar, para além das caraterísticas comuns com outras poéticas inovadoras, algumhas questons chave para entendermos esta nova proposta: a) a quebra com poéticas autorreferenciais, b) a necessidade da encenaçom da regueifa em espaços de participaçom coletiva, como centros sociais, festivais autogeridos e outro tipo de espaços ou eventos paralelos às instituiçons oficiais) e c) a reivindicaçom política explícita nas coplas improvisadas. Isto, se possível, acompanhando outros processos de contestaçom social e criando redes de gestom, produçom e distribuiçom (poética e nom só) à margem do mercado cultural do capitalismo, ou que o questionem, sendo capazes de desestabilizar os campos culturais e de poder. Parece lógico pensar que a criaçom dumha Assembleia de Mulheres Repentistas, como mostra de auto-organizaçom do movimento, ou a auto-denominada Nova Regueifa Feminista, evidenciam a necessidade e posta em prática de alguns destes planos de açom.

Entender a prática antagonista da regueifa como ‘ninhos de autonomia’, como disposiçom de outros modos de fazer autónomos, servirá para criar espaços, possibilitar práticas, que exercitem a imaginaçom política e a construçom de resistências, nem sempre necessariamente afastadas das propostas de açom social mais clássicas. Assim, a incorporaçom da figura da regueifeira em manifestaçons e atos políticos, a modo de manifesto, ou o efêmero da improvisaçom coletiva em diferentes protestos sociais, acompanhada de outros repertórios de contestaçom, podem ser algumhas das renovaçons táticas mais efetivas. Se maior for a nossa caixa de ferramentas para a organizaçom, em termos de mais repertórios e estratégias, maior será a capacidade para o estabelecimento e gestom de agendas próprias dos movimentos sociais.