Numha recente reportagem publicada na imprensa catalá, Georgina Siklossy sintetizava o processo que está a abanar boa parte do mundo occidental cara alternativas de direita extrema, cercanas ou directamente xurdidas da tradiçom fascista. ‘As classes médias sentem que estám a perder, e essas classes som precisamente as que formam o núcleo de estabilidade das democracias sociais e liberais depois da II Grande Guerra’. Siklossy adverte de que o consenso está a rachar, e nesta fenda medra o ‘chovinismo do bem estar’. Umha defesa dos direitos privativos ‘dos nativos’ que reclama as ideias fortes de Estado, tradiçom e identidade para contrapó-las aos novos párias.

Na passada semana analisávamos como as etapas históricas de colapso alimentam a violência e o medo, coalhadas na personalidade autoritária que fundou todo o autoritarismo de direitas. Desta volta imos ver que há de planificado, desenhado e executado no ascenso simultáneo da fascistizaçom. Pois além de correntes sociais de fundo, grandes capitalistas e lobbies com nomes notórios movem com decisom os fios do mundo que aí vem.

Steve Bannon e as doaçons europeias

Nom há que elaborar teorias da conspiraçom para defender a existência dumha trama de alcanço internacional, recursos enormes e poderio mediático, tencionando ruir do interior as democracias burguesas. Na imprensa europeia, o nome de Steve Bannon acadou notoriedade nos últimos anos. Ex-militar, banqueiro em Goldman Sachs, assessor na primeira etapa de Trump, dirigente de Cambridge Analytica e impulsor da publicaçom de ultradireita Breitbart News. Na polémica recente que rematou com parte do prestígio internacional de Facebook veu à tona a cumplicidade das empresas tecnológicas com as iniciativas de filtraçom de dados e manipulaçom de massas a favor da direita extrema. Liderando a rede internacional ‘The Movement’, manifestou abertamente o seu apoio prático ao ‘nativismo’ europeu (todas as correntes de extrema direita que visam a fascistizaçom da Europa, e que apregoam a liquidaçom de direitos para residentes foráneos). A sua equipa de sociólogos, consultores, community managers e expertos em marketing já trabalhou com sucesso nos Estados Unidos para aguilhoar medos e histérias dumha populaçom apavorada por um futuro incerto. Agora trataria-se de fomentar esta mesma tendência na Europa, no produtivo caldo de cultivo do Brexit, o rechaço às refugiadas e a reclamaçom securitária.

É possível que a mao de Bannon estivesse por trás dalguns dos sucessos reaccionários mais célebres dos últimos anos, como Aliança pola Alemanha, ou mesmo Vox. No caso italiano, a conexom é aberta, pois existiu um assessoramento declarado a Salvini, e criadores de opiniom do novo fascismo ligam directamente com o americano. É o caso da tuiteira Alana Mastrangelo, considerada vencelho directo entre a Itália ultra, Bannon, e lobbies violentos como a norteamericana Associaçom Nacional do Rifle.

Cultura narcisista da imagem, apologia das armas e defesa do fascismo unem-se em figuras mediáticas do fascismo como Alana Mastrangelo

Ciente de o decisivo serem, em última instáncia, os recursos materiais postos nesta batalha das ideias, Bannon reconheceu no passado ano que preparava suculentas doaçons para candidaturas ultras às eleiçons europeias em 13 Estados, mas a legislaçom de parte destes países blocou a iniciativa. Os apoios económicos internacionais nom se consentem em parte das legislaçons do Velho Continente.

Dinheiro e confusom, também no Reino de Espanha

Nos anos 30, os fascistas definiam-se como revolucionários, utilizavam o qualificativo ‘socialista’, espalhavam consignas contra o capital e bradavam contra conspiraçons das elites. Se em algo fôrom rupturistas as direitas autoritárias europeias foi na sua utilizaçom inteligente da linguagem e o repertório do protesto. Oitenta anos mais tarde, ideólogos como Bannon chamam com agudeza a abandonar a contradiçom ‘esquerda-direita’ para pivotar a luita em termos como ‘naçom-protecçom’ ou ‘mundialismo-intempérie’.

Nada melhor para o Reino de Espanha, onde a nova direita extrema, numha primeira fase, se denominou ‘liberal’ e pretendeu superar ‘o enfrentamento de bandos’. Estudos como os realizados por Francesc Miravalles e Josep Campdabal (‘De Ciutadans a Ciudadanos. La otra cara del neoliberalismo) explicam como o recurso nacionalista espanhol foi a ferramenta perfeita para dissimular este ultradireitismo na bandeira puramente identitária. Como os teóricos do 98, já inspiradores da extrema direita, e obviamente como Ortega, Ciudadanos recupera ‘a psique acomplexada do nacionalismo espanhol que fala ainda da revoluçom pendente, da revoluçom desde arriba.’

E com os estudos de marketing ideológico venhem também os apoios logísticos e económicos. Desde 2015 sabemos que a primeira saída ao espaço público de Albert Rivera (bem antes da crise das finanças e da explossom anticatalanista) veu de mao de Declan Ganley, um católico integrista ango-irlandês, milhonário e fornecedor de recursos ao exército norteamericano na jeira de Bush filho. Ganley tinha como objectivo na década passada gorar o processo de unidade europeia pilotado polo social-liberalismo, e para isso argalhou a poderosa iniciativa ‘Libertas’. Nela integrou-se o recém nascido Ciudadanos, que foi generosamente financiado por Ganley. Ambos fôrom postos em contacto pola plataforma Intereconomía e Miquel Durán, um dos advogados do caso Gürtel. Ciudadanos recebeu entre 2 e 3 milhons euros na campanha das eleiçons europeias de 2009, e somou-se à lista de beneficiários de Ganley, entre os que se achavam também plataformas antiabortistas e xenófobas de Centroeuropa.

O mecenas do catolicismo ultra na Irlanda e na Polónia financiou a decolagem de Albert Rivera

Apesar de a experiência ‘Libertas’ (como a primeira cita eleitoral de Ciudadanos) saldar-se com um rotundo fracasso, sementava-se o que havia acontecer na década seguinte, com umha populaçom mais sugestionada e amedonhada, susceptível de optar por soluçons desesperadas. De facto, o ‘nom’ irlandês ao Tratado de Lisboa, fomentado com ênfase por Ganley, impediu avanços cara a unidade política continental, e em certo modo, foi um antecipo do mais rotundo e chamativo Brexit.

Sionismo, aznarismo e Vox

Vox, o partido da ultradireita mais convencional e apegada estética e sentimentalmente ao franquismo, tampouco é alheio a tramas de alcanço. Um dos seus dirigentes e ideólogos é o pacense Rafael Bardají. Licenciado em Ciências Políticas e Sociologia, é homem de confiança de Aznar desde os tempos da guerra imperialista contra o Iraque. Foi assessor do Ministério de Defesa do PP e, naquela altura, confessou em entrevista ‘ter passado muitas horas na Casa Blanca’. Várias reportagens de investigaçom da imprensa espanhola situam naquela altura os seus contactos com o mundo da extrema direita norteamericana. Na actualidade, de maneira confessa, mantém relaçons com Steve Bannon e Nikel Farage, o exitoso líder da extrema direita británica.

Rafael Bardaji, assessorado por Steve Bannon, o ideólogo ultra norteamericano

Com a alternáncia governamental do PSOE, Bardají refugiou-se em fundaçons, centros de estudos e plataformas conservadoras, numha atitude habitual dos quadros político institucionais que jamais se reintegram à actividade laboral convencional. Foi Director de Política Internacional de FAES e subdirector de Investigaçom e Análise do Instituto Elcano. Nos gabinetes destes organismos foi elaborando -possivelmente baixo supervisom de Aznar- umha ‘estratégia de reubicaçom da direita’. Com certeza, os estrategas do extremismo intuiam a crise civilizatória na que nos adentrávamos a primeiros deste século, e as suas prospectivas apontavam a novas plataformas partidárias e mensagens identitárias.

Junto a Aznar e a dirigentes políticos americanos e europeus topamo-lo em Paris em 2010, fundando a ‘Iniciativa de Amigos de Israel’. A entidade funda-se finalmente em Miami e recebe mais de 9 milhons de dólares em doaçons entre os anos 2013 e 2016. Entre os doantes afamados figura Sheldon Adelson, magnate dos casinos que foi apoiante de Trump nas eleiçons. De feito, entre as várias contradiçons que empecem um único bloco da ultradireita europeia acha-se a relaçom com Israel. O antisemitismo, enraizado especialmente nas zonas de tradiçom nazi, bate com a inspiraçom pro-sionista e anti-mussulmá do movimento ultra pilotado desde a outra beira do Atlántico. Bardají, fiel à histórica subordinaçom espanhola ao grande imperialismo, escreveu que ‘a nova direita alternativa deve superar o antisemitismo histórico’. É por isso que na sua conta de twitter, o responsável de relaçons internacionais do Likud desejava sorte a Vox nas passadas eleiçons espanholas.