Enrique Dussel define a si mesmo como “filósofo”, além de ser historiador e crítico teológico. Nasceu no dia 24 de dezembro de 1934, em La Paz, um pequeno povoado da província de Mendoza, na Argentina. Cosmopolita e de espírito inquieto, após se graduar em Filosofia, na Universidade Nacional de Cuyo (UNC), viveu em vários países da Europa com a finalidade de continuar seus estudos (Espanha, França e Alemanha, entre outros) e em Israel. Voltou anos depois, com doutorado em Filosofia, em História e com estudos em Ciências da Religião, para se estabelecer outra vez em seu país.

No dia 2 de outubro de 1973, por seus vínculos ideológicos com os movimentos revolucionários argentinos, um ‘grupo de tarefas’ atentou contra sua vida ao colocar uma bomba em sua própria casa. Desde então, vive no México, onde se nacionalizou e produziu a maior parte de sua obra. A mesma conta hoje com mais de 50 livros e mais de 400 artigos traduzidos para várias línguas, o que gerou uma grande quantidade de dissertações sobre um pensamento ético-crítico e transformador em todo o planeta.

O afamado filósofo, reconhecido como um dos criadores da Filosofia da Libertação e inspirador de milhares de militantes e pensadores em todo o mundo, foi recentemente nomeado membro da Academia de Ciências e Artes nos Estados Unidos e recebeu reconhecimentos similares em todos os cantos do mundo.

Recebeu-nos em sua casa, em Cidade do México, para conversar sobre diversos assuntos: a vida e a morte, a saúde e a doença, a mudança climática e os possíveis destinos não só da América Latina, como também do mundo e da humanidade em geral. Na sequência, apresentamos a excepcional conversa.

A seguir, a entrevista.

Resumen Latinoamericano: Em sua “Ética da Libertação”, de 1998, você cita Humberto Maturana. O afamado biólogo chileno costuma comentar que “não é que exista algo assim como ‘a vida’ em sentido abstrato, ou como enteléquia, mas, sim, que existem seres vivos autopoiéticos”. O que você pensa de tal afirmação?

Enrique Dussel: Bom, realmente o que Maturana propõe tem muito a ver com a ética como eu a concebo. A vida é autopoiética. As plantas e os animais vão reproduzindo a vida e em um processo como antientrópico, porque vão tirando o mais do menos. O mundo físico, astronômico, vai gastando energia e vai se degradando. Ao contrário, a vida é como um processo antientrópico, porque vão sendo criadas coisas novas, etapas qualitativas superiores.

Em torno do humano, a vida conseguiu sua maior complexidade e um desenvolvimento ainda indefinido para o futuro. Isto se é que mudamos os usos da civilização, que já começou, por outro lado, um processo entrópico geometricamente desenvolvido que levará à extinção da espécie humana. Já por cinco vezes a vida matou mais de 90% dos viventes e a última foi a etapa dos dinossauros. Estamos na quinta etapa, mas o antropoceno – a etapa do ser humano – parece que está acabando, caso continuemos o caminho que empreendemos. Iremos destruir a vida humana e também grande parte da vida que é parasitária de nossa vida.

Portanto, talvez tenhamos começado a pressagiar uma sexta etapa da vida, que ainda não será o fim da vida das baratas, dos ratos e outros tipos de insetos e animais pequenos. É possível que surja a próxima etapa da vida em que o Homo Sapiens terá desaparecido porque se produziu um processo suicida. Estamos no tema vida e morte.

E em relação ao tema da vida, central na Filosofia da Libertação, você poderia nos oferecer alguma definição da “vida humana” em particular?

A morte e a vida sobre as quais falamos não é o conceito de vida, nem da boa vida, mas, ao contrário, factualmente o fato de viver e isto não precisa de definição. Uma criança sabe muito bem, se alguém mostra figurinhas: uma pedra, uma casa, uma árvore e uma flor a uma criança de 4 anos e lhe diz: entre estas figurinhas, quais são as de seres vivos. Não lhe escapa uma, sabe o que é um ser vivente.

A vida é o ponto de partida de todo o humano. A política tem a ver com a afirmação da vida. A economia tem a ver com a afirmação da vida. Podemos dizer que a vida é a condição absoluta e universal de tudo o que o ser humano faz. Se matamos as condições que permitem a vida se reproduzir e crescer, então, é um ato ruim. É um ato bom se permitem a reprodução e o crescimento da vida. Mas, claro, às vezes, alguns exploram outros e também vivem dos outros. Essa seria a injustiça econômica, por exemplo, mas continua sendo um tema da afirmação ou negação da vida. O mal seria necrófilo, o que ama a morte. E biófilo seria o que ama a vida.

A concepção médica ocidental pensa “a vida” do ser humano em sentido dualista, o corpo (soma) por um lado e a mente (psique) por outro, cada qual de forma separada, com seus respectivos “sintomas” e “sofrimentos”. Além disso, de forma isolada de seu contexto histórico, social, cultural, político e filosófico. Você acredita que a medicina moderna precisaria mudar tal antropologia de raiz grega-cartesiana e pensar o ser humano a partir de outra perspectiva?

A medicina, assim como todas as ciências, toca diretamente o tema da vida. É a arte de curar, ou seja, evitar a doença para prolongar a vida. Isto deveria ser a essência da medicina. Contudo, como o exercício da afirmação da vida se dá em estruturas ideológicas, políticas, econômicas e outras, precisamos enxergar que a própria medicina primeiro responde a um conceito da vida.

Entre os gregos, o corpo era a vida. A alma dava a vida ao corpo, mas a medicina curava um pouco o corpo. Claro que dizia: uma mente sã em corpo sadio. Contudo, a mente não era objeto próprio da medicina, mas, sim, o corpo. E, muitas vezes, a medicina atual, pelo modo de intervenção, também continua pensando que o tema fundamental é a corporalidade sofredora – como enfermidade – que supõe uma vida não cumprida. E, então, eu poderia definir a medicina como uma ciência, uma instituição e instrumentos que afirmam a vida e a luta contra a enfermidade.

Contudo, por sua vez, a enfermidade também vai se definindo de outra maneira na história. Na Idade Média, pensava-se que um enfermo poderia estar sujeito a uma ação demoníaca. Então, fazia-se um exorcismo do demônio para curar alguém, pois o mal era habitado por um espírito maligno. Nós, ao contrário, vamos para uma visão mais material. Não digo corporal, porque isso é diferente.

Em sua opinião, quais são os fatores e interesses que determinam as noções de Enfermidade e Saúde na atualidade?

Há uma grande influência da farmacologia. São oferecidos remédios que são produzidos por uma indústria que cura a enfermidade com uma intervenção, às vezes, violenta do médico. Agora, o que muitas vezes não pensamos é que esses remédios fazem parte de um sistema de transnacionais – por exemplo, a Bayer – que produzem não só sementes transgênicas, como também remédios. Mas, ao ser uma transnacional capitalista, sua finalidade de fundo é ter lucros.

Então, eu poderia dizer que a farmacologia é algo como a técnica pela qual o capital consegue lucro por meio da exploração da enfermidade. É assim que os pobres não podem comprar os remédios mais apropriados para poder curar as enfermidades novas que são produzidas. Quero dizer, então, que também há um problema econômico que determina o uso da medicina, e o médico, de certa maneira, é um instrumento de um grande sistema de exploração da enfermidade.

Seria necessário começar a ver com funciona isso. Hoje, um médico normalmente cobra uma consulta o que custa ou trabalha para uma clínica. Laín Entralgo, que foi um médico espanhol, tem uma história da medicina. Desde quando um médico cobra privadamente de um cliente enfermo? Desde quando e por quê? Isso acontecia em todas as culturas? Acontecia para além da Idade Média? Desde quando se quantifica economicamente o serviço de um médico?

Você foi reitor da UACM e é professor universitário. Qual é o papel da formação universitária e da produção de conhecimento nestes temas?

O serviço do médico funciona para evitar a enfermidade. E, portanto, o médico se transforma em instrumento de um sistema. Na Faculdade de Medicina, estuda-se a anatomia, a fisiologia e uma quantidade de partes da ciência médica para lutar contra a enfermidade. Contudo, não se estuda todo o sistema da exploração da enfermidade. Isso já seria metafísica, ou ética, e parece que não corresponde à Medicina. Mas, é justamente o tema. O médico é um instrumento do capital, e por isso há uma medicina para as classes altas que podem pagar e uma “medicina massiva” para os que não podem pagar, que, é claro, morrem antes, ainda que a [expectativa de] vida tenha crescido em relação a sua duração quantitativa.

O que cria, por sua vez, outro problema, de repente, a terra se torna pequena para uma expansão da espécie Homo. A Terra não foi feita para essa quantidade de pessoas, começamos a ser muitos. Claro, o modo como hoje se soluciona o assunto é que os pobres morram. Na realidade, o racional seria não conceber tantos novos nascimentos para que baixássemos a demografia e a terra voltasse a crescer. Há situações políticas e econômicas que determinam a Medicina e esta, às vezes, não capta toda essa complexidade.

Por isso, o tema ético na medicina e na formação de profissionais da saúde é voltar à origem. Afirmar a vida do ser humano e não tanto explorar a enfermidade que pode parecer o mesmo, mas não é a mesma coisa porque a exploração da enfermidade se torna cada vez mais cara para os que enfrentam os últimos dias da vida. Mas, ao mesmo tempo, o sistema econômico produz pobres que morrem antes do tempo porque realmente não podem pagar esse tipo de Medicina. Claro, de alguma maneira, é necessário socializar a Medicina. Quer dizer que há um problema de injustiça em relação à luta contra a enfermidade.

Como seria possível descolonizar o discurso ocidental-moderno no campo da Saúde –condicionado, como já mencionou, por fortes interesses econômicos –, a partir de uma visão própria das maiorias populares e na perspectiva da Filosofia da Libertação?

Para a Filosofia da Libertação, o primeiro princípio ético válido para todas as ações humanas e também para a medicina seria se ocupar de afirmar a vida e efetivamente a prolongar no tempo de uma maneira feliz. Isso é o princípio material da ética. O segundo princípio é como afirmaremos a vida e aí já vem o consenso, a organização política que se formula em um princípio democrático. Não é assunto que o ditador diga como se afirma a vida, mas que o povo possa definir como irá distribuir essa vida. E, depois, o terceiro princípio é o da factibilidade, ou seja, que seja possível isso que foi decidido sobre como se deve afirmar a vida.

Esses três princípios na Medicina funcionam muito bem, mas, como dissemos, há injustiça. Aí temos uma quantidade de problemas que guiam uma reflexão sobre a transformação do sistema da saúde: que é afirmação da vida e a luta contra a enfermidade, mas dentro de uma distribuição justa dos meios para se chegar a esses fins.

Isso também supõe um estado que se ocupe da saúde como um direito humano e que crie os instrumentos para que realmente chegue até as pessoas uma medicina como deveria ser. A questão é que é necessário mudar as estruturas, não só da medicina, mas também da economia, onde a finalidade já não seria o aumento da taxa de lucro, mas, ao contrário, o aumento da qualidade da vida.

Há um dilema entre o aumento do lucro e o aumento da qualidade de vida, a felicidade. Na Argentina, há um ditado que diz que um ladrão se aproxima e diz a alguém: a bolsa ou a vida. A bolsa seria o dinheiro e a vida pois, dou-lhe um tiro. Mas, se assumíssemos a proposta a sério, seria a bolsa de Wall Street ou a vida humana. O sistema mundial aponta para cabeça de todos nós. Então, de repente, a medicina se liga à economia, mas, por sua vez, a economia se liga à política, porque mudar hoje o sistema econômico acarreta medidas políticas muito forte.

Esta realidade supõe uma nova teoria e também, claro, se pode dizer uma ética, mas não é uma ética dos valores ou uma ética da honestidade individual, para dizer que eu sou bom. Não, não. Tem que ser uma ética realmente pensada a partir das estruturas reais. Quem irá investir um peso, se não receber mais percentagem anual do que se fosse investir em outra coisa? A racionalidade é o aumento da taxa de lucro, isso é real. E quem não faz isso se afunda, e afunda, pois, a empresa que tinha fecha e os que trabalhavam nessa empresa ficam sem trabalho.

Então, a questão é grave e é de conjunto, mas estamos chegando a limites e justamente a vida volta a estar no Horizonte próximo, porque ecologicamente estamos destruindo as condições que possibilitam a reprodução da vida. O aumento da temperatura, o buraco na camada de ozônio, os plásticos que invadem os oceanos. Já agora, até o mais rico superbilionário de Wall Street também irá respirar ar poluído, irá tomar plástico e irá morrer como o último pobre. Claro, não tão rápido. Primeiro, irão morrer os pobres, mas os outros também. E, além disso, quando os pobres morrerem, o que os outros irão fazer?

Estamos diante de um tempo apocalíptico, no fim dos tempos em um sentido meio mítico. Porque não há muito futuro para a humanidade, caso continue como está e nisso, então, a medicina já passa à ecologia. A ecologia se transforma em remédio que agora trata a enfermidade da terra, que é a destruição ecológica. Essa é a grande enfermidade. E como conseguir, então, que a vida continue para as próximas gerações.

Por isso, comove eticamente e racionalmente a garotinha de dezesseis anos sueca que, outro dia, se dirigiu a uma assembleia de cientistas. Eram quase mil e a garotinha, com um inglês muito bom, disse: nós, as futuras gerações, estamos pedindo para que mudem a ordem ou iremos morrer. E quando disse isso, rolou lágrimas da garotinha. Então, disseram: isto é novo. Nunca houve na história uma rebelião das crianças. Não com piadinhas, mas indo ao fundo da questão: vão destruir a Terra e nós seremos as vítimas. Isso supõe uma ética forte e também uma redefinição da Medicina.

À luz destes debates, como avalia a realidade da América Latina? Que impacto poderá ter a irrupção do governo de AMLO [López Obrador], no México, e que coisas estão em jogo na eleição presidencial da Argentina, no fim do ano?

O México, hoje, está em meio a uma batalha política e econômica. Porque caso tome certa medida, o capital se retira, desvaloriza a moeda, o país entra em crise e ocorre uma hecatombe. A política tem a ver com a forma como se dirige o tema econômico. Não é nada fácil, hoje, dizer que iremos fazer o que fez Lenin, um estado onde os produtores sejam proprietários da empresa e define o socialismo do século XX. Isso não é tão fácil, hoje, o capital está muito organizado e já conhece a experiência e sabe como lutar contra eles.

No início deste século, houve o que chamamos de uma primavera política. Eu escrevi meu livrinho 20 teses de Política dizendo que, após 500 anos, estávamos vivendo uma primavera política com as Mães da Praça de Maio, os piqueteiros, os sem terra, os cocaleiros. Também com os governos do Equador, com Correa, Bolívia, com Evo Morales, Guatemala, o Fórum Mundial de Porto Alegre. Néstor Kirchner, na Argentina, Tabaré Vásquez, no Uruguai, Lula, no Brasil.

Bom, parecia que estávamos em uma nova etapa. E em pouquinhos anos, raff! Eu acredito que houve dois passos à frente e um para trás. Mas, não é somente nós, os Estados Unidos estavam distraídos com o Oriente Médio, querendo chupar todo o petróleo e cumprindo as ordens do Sionismo. Não de Israel, mas, sim, do Sionismo, fazendo cacos de tudo o que podia ser um perigo para Israel. E, então, se envolveu no Oriente Médio e saiu derrotado! Porque não ganhou nenhuma batalha e agora sai e retira seus soldados do Iraque, e não ganhou a batalha. Na Síria, também não. Destruiu a Líbia, mas não a conquistou.

Então, disseram: bom, já fizemos muita bagunça, vamos retornar para o nosso. E, infelizmente, volta para a América Latina e temos diante de nós o de sempre, o Império. Fizeram-nos retroceder, e sempre com novos métodos. Antes, eram as ditaduras militares, agora, as organizaram para corromper o sistema judiciário. E agora os golpes de Estado são judiciais. Quem diria!? Prendem Lula, querem prender Cristina Kirchner também. Bom, teremos que ver como depuramos o sistema jurídico. Houve um passo para trás, mas também foi desastroso para o Neoliberalismo.

Macri é um desastre. De Bolsonaro, o que falar![?] Outro Trump. E isto não tem solução, porque se entregam para os Estados Unidos. E os Estados Unidos não têm nenhuma corresponsabilidade e já que se entregam, são melhor explorados. Não têm uma doutrina a médio prazo. Mas, agora, vem a imigração da América Central. Produzida pelos Estados Unidos! Fizeram uma ditadura em El Salvador. O abacaxi de Costa Rica tem um preço péssimo. Pagam muito baixo pelo valor da banana na Guatemala. Então, a pobreza vem como imigração.

Havíamos tido um pequeno triunfo, mas, agora, a direita é apoiada pelos Estados Unidos, sobretudo golpeando a Venezuela, fazendo acreditar que a Venezuela não resolveu nada. Mas, foram os Estados Unidos que cortaram até o papel higiênico da Venezuela. O que dizer dos remédios. E atribuem isso ao Chavismo, mas a verdadeira causa é o bloqueio do Império, diante de um país pequeninho que não pode se defender.

Então, temos um Estados Unidos que está se reposicionando e um Trump que é cada vez mais absurdo, mas que muitos o seguem porque há uma direitização do senso comum. Mas, também perdeu hegemonia pelas mãos da China. Então, estamos em meio a uma grave crise política e será necessário agir com muita inteligência. Não é possível uma Revolução Russa, nem cubana. Trata-se do modo como levamos adiante, nesta etapa dura dos Estados Unidos, uma nova possibilidade, e é por isso que no México está se tentando algo muito importante, que é a possibilidade de resistir sem ortodoxia, porque, aqui, não a ortodoxia socialista já não funciona. Não há, aqui, Socialismo do Século XXI. O que haverá? Seria muito mais um Neoliberalismo frágil, o que já seria muito bom.

A factibilidade se faz fundamental e a defesa do próprio é fruto de uma grande inteligência política. Pois isso é o que López Obrador está mostrando hoje. Mas, conta com muitíssimos problemas internos: a criminalidade, a droga que tem o mercado norte-americano, a matança pelas armas que os Estados Unidos exportam. Ou seja, a causa dos problemas do México são os Estados Unidos, e nem sequer é possível recordá-los disso porque ficam histéricos. Mas, o senhor Trump não pensa que o problema é que todos os norte-americanos estão drogados. São o maior mercado de consumo de droga. E isso porque são um povo insatisfeito.

A situação é complicadíssima e exige uma filosofia política de grande realismo crítico. Com uma ética muito forte por um lado e, por outro, uma inteligência grande para poder dar um xeque no monstro norte-americano. Agora, é um fator muito importante na América Latina, porque México sempre havia jogado em favor dos Estados Unidos. É fundamental pela relevância do México e por suas dimensões no continente, e eu acredito que, na Argentina, Macri irá cair, e Bolsonaro, quando lhe tocar, também irá cair. Não ascenderá um governo revolucionário, ascenderá um governo que mudará os buracos gigantes deixados por Macri.

As pessoas vão tomando consciência de que a situação é difícil e que é necessário se comprometer. Estamos na luta pela Segunda Emancipação. A primeira foi em 1810, e agora estamos na segunda. É o que dizia José Martí, e também José Carlos Mariátegui. E como lutar a não ser se abrindo militarmente à Rússia e economicamente à China? Ao menos para jogar em terceiro lugar, nem um, nem outro. A situação é muito difícil, mas a história continua e os povos continuarão lutando.

Eu digo: não sou otimista, mas não perco a Esperança. Quando todo o mundo disse isto é uma catástrofe, acabou a etapa progressista da América Latina, eu disse que era uma etapa na qual o progressismo recebeu um golpe merecido, porque também não tomou cuidado com a corrupção e outras coisas. Tampouco se desenvolveu uma teoria, como destaca Frei Betto. E, bom, agora é necessário fazer a autocrítica, apetrechar-se e avançar lentamente.

O povo aprende pelo sofrimento, não há outro. Não é pelas aulas. Nós, teóricos, podemos formular para esclarecer as causas desse sofrimento e lhe dar um caminho, mas quem sofre possui a inteligência mais aberta para entender quem é quem. Sempre e quando os meios de comunicação não lhes tergiversem todas as categorias de interpretação e lhe façam interpretar a realidade ao contrário. Mas, nisso as próprias redes de celulares vão criando uma midiocracia paralela que já começa a funcionar mais forte. As pessoas não absorvem tudo tão fácil, mas ainda continua sendo muito forte. Seria de se esperar que, caso Macri caia, acabe o Clarín para sempre e todos sejam presos de uma vez por todas. Mas, caso sigam querendo mantê-los, terão que continuar sofrendo.

É o longo caminho da História. Só que agora já estamos vendo o processo, já não somos ensinados pelos norte-americanos ou europeus. Temos uma visão própria e até lhes podemos ensinar como se luta contra o império. Os próprios Europeus estão desorientados. Viviam à sombra dos Estados Unidos, a árvore se moveu e agora ficaram sob o Sol e precisam começar a fazer as coisas, mas percebem que estão mal preparados. E nisso temos mais aliados. Eu tenho Esperança, não sou otimista.

A entrevista é de Manuel Fonseca, Omar García Corona e Facundo Tineo, publicada pelo Resumen Latinoamericano no dia 01 de julho. A tradução é do Cepat.