Entre as várias -e por vezes mesmo contraditórias- leituras que sempre se podem fazer duns resultados eleitorais, umha poderia salientar: a espanholizaçom do comportamento eleitoral na Galiza, tendência que assentou na última década e que nesta ocasiom, porém, pode ser matizada pola duplicaçom de apoios ao BNG. De qualquer modo, numha campanha condicionada pola irrupçom da velha extrema direita em novas roupagens, a maioria das votantes apostou por impugnar a ‘radicalizaçom’ apoiando a direita liberal. Com o seu clássico disfraz de esquerda, o PSOE derrotou o PP pola vez primeira em corenta anos no território da CAG. De resto, a operaçom de divisom do nacionalismo moderado acometida em 2012 polo fenómeno das ‘Mareas’ impossibilita mais umha vez a presença de soberanistas galegos em Espanha.

Historicamente abstencionista, a Galiza registou desta volta umha importante participaçom : um 74 % dos votantes acodírom às urnas, face o 80 % registado no resto do Reino. Com isso e contodo, quase 600000 galegos e galegas rejeitárom votar por umha diversidade de motivos impossível de homogeneizar numha análise.

Para além disso, os estrategas de campanha da direita liberal conseguírom o grosso dos seus objectivos, mobilizando o eleitorado agitando o medo a umha extrema direita reorganizada em três partidos, um especialmente agressivo. Na Galiza, o sucesso foi notável, pois o PSOE desloca o PP como primeira força após 37 citas eleitorais como primeira força. Com um 30 % de votos como pior dos seus resultados históricos no território da CAG, o PP descende agora ao 27 %; o PSOE consegue 32 % e logra dez escanos.

Certos analistas lembram que tal afortalamento da direita liberal em contextos de ameaça real ou figurada nom é nova, e de feito nas redes sociais houvo mençom às relaçons ambíguas do ‘socialismo’ de François Miterrand com a Frente Nacional ; o primeiro aproveitou o auge da direita racista francesa para assentar o seu domínio.

Porém, o triunfalismo face a suposta ‘derrota’ do extremismo espanhol tampouco nom parece ter demasiado lugar. Na nossa terra, o entramado caciquil galego-espanhol mantém a sua vitalidade no médio prazo histórico, e o enfraquecimento do PP nom é nem muito menos decadência. Outros dous deputados do extremismo espanhol, os conseguidos por Ciudadanos em Corunha e Ponte Vedra, demonstram a amplitude dos seus apoios sociais. Para além disso, a explossom ultra dessatada em Espanha a raiz do auge arredista catalám pujo em cena um actor político preocupante. Como manifestou o analista político basco Jonathan Martínez, ‘se algo mostrou a experiência europeia, é que a ultradireita nom precisa governar para impor a sua agenda de ódio e gerar debates falsos por volta de direitos elementais que achávamos intocáveis. Os meios do IBEX 35, com o seu branqueio programado de Vox, conseguírom virar para a direita o debate público até o extremo de que mesmo um partido tam ligado ao regime como o PSOE semelha um alívio aceitável. O PSOE da monarquia, das portas giratórias, das reformas laborais e dos resgates à banda alça-se agora, por obra e graça de Vox, como um elixir de progresso.’

Cabeçalhos referenciais do capital, como o ‘Financial Times’, tinham expressado a sua conformidade com um governo em maos do PSOE como garantia de ‘estabilidade’. De facto, um dia depois da jornada eleitoral, os chamados eufemisticamente ‘mercados’ recebiam com tranquilidade a renovaçom do governo social-liberal, com a excepçom da empresa ENCE, que recuava em bolsa pola incertidume do seu futuro.

Soberanismo como actor de primeira magnitude

O espectacular resultado de ERC, com 15 deputados em Espanha, demonstra o calado do chamado solidário com presos e exiladas, e situa de novo a questom catalá no centro do debate político ; o independentismo basco, com quatro representantes de Bildu, poderia contrapesar a viragem ao autonomismo protagonizada polo PNV no último lustro.

Na Galiza, a consecuçom por parte do BNG do 5 % da quota eleitoral e de 92000 sufrágios levou o nacionalismo a umha análise optimista, entendendo a cita eleitoral como um avanço cara possíveis logros qualitativos futuros. No mesmo sentido se pronunciavam analistas de referência no galeguismo

Ainda, e apesar da claridade das cifras, o sabor de boca é muito outro na Galiza : a ausência de galegas e galegos conscientes de sê-lo em Espanha durante quase umha década aumenta a invisibilidade da nossa questom nacional. Esta realidade, com causas muito diversas, remite porém a dous processos entrelaçados da história recente : na primeira década deste século, à perda de credibilidade do BNG entre sectores muito amplos da Galiza organizada e rebelde, depois de muito tempo vegetando no autonomismo e em ambiguidades impossíveis; já nesta década, a entrega de parte do movimento nacional ao espanholismo, que o fagocitou nas chamadas ‘Mareas’, impossibilitou por pura aritmética eleitoral a presença galega em Madrid. Os resultados testemunhais de Em Marea no dia de onte (apenas 17000 vozes) e a condiçom espanholista dos deputados de Em Comum-Unidas Podemos eleitos pola sucursal galega do partido, confirmam mais umha vez que a Galiza desaparece do mapa institucional.

Independentismo e linha histórica

O independentismo é, na Galiza, a única corrente política nacional que enfatiza a necessidade de diferenciar comportamento social e comportamento eleitoral, e a nom confundir Estado com governo. Com essas pontualizaçons, toda cita eleitoral deve contemplar-se com enorme relativismo. Nessas coordenadas cumpre entender a análise publicada por Causa Galiza, na que apostava polo ‘voto táctico’ no BNG como forma de entorpecer um possível governo estatal neofascista, e como barreira contra a invisibilizaçom galega. Com isso e contodo, a espanholizaçom do mapa eleitoral na nossa terra é também fruto -entre outras muitas circunstáncias- do persistente défice organizativo do independentismo, como assinalava também o comunicado de Causa Galiza. É o processo de afortalamento dumha alternativa política arredista sem hesitaçons, na que anda embarcada esta organizaçom através do ‘Processo Trevica’, a que no médio prazo poderia virar realmente as tornas. Causa Galiza aproveitou também a chuva de controvérsias às que soem dar lugar as campanhas eleitorais para respostar críticas distorcidas e confusas contra a organizaçom e a linha histórica do independentismo.

Aceleraçom histórica

Seja como for, os mapas eleitorais que se tenhem generado depois de estoupar a crise das finanças patenteiam que a volatilidade é a norma: em menos dumha década, passamos dumha suposta defunçom de partidos como PSOE e BNG ao seu novo reassentamento; da eufória da ‘nova política’ ao seu esvaecer como moda efémera ; da crise do bipartidismo a certa resistência do mesmo. Num panorama de recentralizaçom e pioramento das condiçons de vida, o futuro social e eleitoral está muito aberto.