Nuns dias nos que a centralidade da imprensa comercial silencia o risco de feche do jornal basco ‘Gara’, resulta um exercício elemental de memória histórica esclarecer quem é o juiz que está por trás dumha hipotética liquidaçom deste cabeçalho da imprensa popular : Baltasar Garzón. Reverenciado pola esquerda do Regime e arredado da judicatura polos seus próprios companheiros, a figura deste homem chega ao nosso país : protagonizou umha importante rusga política contra o independentismo organizado em APU em 1991, e mereceu a devoçom da intelectualidade progressista tolerada pola sua investigaçom dos crimes do franquismo. Imos gizar alguns dos feitos e intençons que guiárom a sua trajectória.

Da Galiza a Catalunha, logo a a Euskal Herria

Na nossa Terra, Garzón fijo um primeiro ensaio do que logo seria a doutrina de longo alcanço do ‘combate ao entorno’. Em 1991 detivo e encarcerou a várias dirigentes da organizaçom Assembleia do Povo Unido por alegados vencelhos com o EGPGC, no que supujo umha séria estocada ao independentismo organizado. A operaçom, centrada na cidade de Ferrol, levou a prisom várias militantes do sindicalismo, o feminismo e a luita anti-repressiva, todos eles militantes da APU. Na altura, nos momentos mais duros do conflito basco, a ninguém se lhe ocorria formular a ideia da total puniçom dum movimento social e político polas suas simpatias -reais ou figuradas- pola luita armada.

Apenas um ano depois, em 1992, Garzón protagonizou a operaçom que leva popularmente o seu nome, e que deu com 49 independentistas cataláns nos calabouços -e alguns deles nas cadeias- por suposta relaçom com Terra Lliure. O caso tivo imensa transcendência mediática na Catalunha -nom assim no resto do Estado- e passou à história como ‘A Garzonada.’

O súper juiz partilhava na altura a inquietude de Felipe González e o seu ministro de interior, José Luis Corcuera, polo possível deslozimento que iam sofrer os Jogos Olímpicos pola acçom do arredismo catalám, e empregou-se a fundo numha operaçom na que estivérom presentes as torturas. Dezassete das pessoas detidas denunciárom ter padecido maus tratos e levárom o seu caso ao Tribunal de Estrasburgo. Este reconheceu as irregularidades do caso, e desaqualificou Garzón por nom ordenar a investigaçom das denúncias de vexames.

Baltasar Garzón nom foi o primeiro juiz a avalar as torturas mas si foi o primeiro em transitar o caminho da teoria do ‘entorno’ e das ilegalizaçons consequentes, amparando judicialmente as teses que sostivo o executivo de Aznar desde 1996. Instruiu o conhecido sumário 18/98, internacionalmente conhecido por sentar no banco dúzias e dúzias de quadros do movimento social e político basco, inclusive alguns dos que rejeitavam a utilizaçom da violência defensiva. O encerramento do Egin e o encarceramento dos responsáveis da empresa Orain figuram também no expediente mais negro do juiz. Um sumário como o 18/98 conseguiu fazer pagar penas de prisom entre oito e doze anos a militantes sem nenhum delito concreto, mais que o seu suposto envolvimento na ‘estratégia de ETA’. Por palavras dum conhecido cabeçalho da direita espanhola, o encadeamento dos ‘etarras sem pistola’ foi chave para impor a mudança de rumo da maioria da esquerda abertzale para umha estratégia eleitoral, mais dumha década depois.

Martxelo Otamendi, um convito pacifista que dirigia o ilegalizado Egunkaria e que padeceu torturas a maos da guarda civil, opinou recentemente sobre o caso Egin e o papel de Garzón : ‘estou totalmente certo que Salutregi (director do Egin encarcerado durante oito anos) e os demais imputados nom eram membros de ETA, limitavam-se apenas a dirigir um jornal.’

A doutrina estabelecida, que tivo o seu correlato legislativo na aprovaçom da conhecida ‘Lei de Partidos’, permitiu também a ilegalizaçom e perseguiçom policial implacável contra partidos como o PCE(r) e organismos solidários como ‘Socorro Roxo Internacional’, que dérom com dúzias de comunistas e antifascistas na prisom polo seu trabalho de organizaçom e propaganda.

Jornalismo popular, no alvo Se algo abraiou e animou os movimentos populares que, em distintas latitudes, luitam para mudar radicalmente as cousas e desafiar a sério o poder, foi o pulo que o movimento basco demonstrou para pôr na rua um outro meio : com um vertiginoso processo de subscriçom popular, a esquerda abertzale foi quem de pôr na rua um modesto jornal, primeiro, o Euskadi Información, e o Gara, posteriormente. Fontes do jornalismo alternativo basco manifestam que Garzón nunca tomou a bem tamanha resposta, e desde primeiros deste século tenciona que se considere Gara ‘continuador ideológico’ do Egin.

No ano 2003 e como consequência das suas manobras, a Seguridade social notifica a Gara e as suas empresas que som responsáveis solidárias das dívidas de Orain e Egin (mais de 5 milhons de euros a pagar em apenas 15 dias) . A tal ponto chega a teima anti-GARA do ex-juiz que chegou a agendar reunions com inspecçom de trabalho e outros órgaos para consumar a sua hipótese de sucesom ideológica e afogar economicamente o jornal. Foi assi como a Tesoureria da Segurança Social citando as investigaçons e autos de Garzón en actvo naquela altura acordou declarar a GARA responsável daquela dívida.

Um historial para a lembrança

Sobejadamente se conhece o coqueteio de Garzón com a política, nomeadamente com o PSOE, encetando também a popular figura dos ‘juízes mediáticos’ que tanto percurso teria na sociedade do espectáculo. Lembremos que Grande Marlaska, também valedor da lei antiterrorista e das torturas que decorrem ao seu acobilho, nom é o primeiro em ocupar postos de poder no governo : Garzón foi secretário de Estado no ano 1994. Depois de abandonar tal posto continua a sua carreira na Audiência Nacional, retratando-se como um juíz mediático que viaja de helicóptero para conhecer de primeira mao a matéria. Assi foi como chegara a Galiza na operaçom Nécora, outro macrosumário que o fixera popular em 1990, em parte dos ambientes da luita contra a droga nas Rias Baixas.

A sua iniciativa contra a prescriçom contra os crimes do franquismo e a sua tese da ‘justiça universal’ que daria lugar ao possível processamento de repressores sudamericanos serviu para limpar, a olhos da esquerda tolerada, um expediente mais do que túrbio. O ‘campiom dos direitos humanos’ podia permitir-se -a olhos dos defensores da dupla vara de medir- a perseguiçom de partidos, o encerramento de jornais, e o amparo dos maus tratos em esquadras e quartelinhos.

No ano 2011 foi condenado polo Tribunal Supremo a onze anos de inhabilitaçom por prevaricaçom, no marco da causa Gürtel, o que o situou novamente como alegada vítima da extrema direita empoleirada no aparelho judicial. Mas este contra-tempo nom rematou com a ánsia de protagonismo nem a marcada controvérsia do primeiro ‘juiz estrela’ do Regime.

Depois do seu abandono da judicatura começa um periplo de palestras e promoçom pessoal. É doutor honoris causa pola Universidade de Jaén e asesor em matéria jurídica de vários países de América Latina.

Valedores na esquerda tolerada

A condena a 11 aos de inabilitaçom por práticas prevaricadoras no caso Gürtel serviu para identificar falsamente a sua figura como um juiz independente de sensibilidade progressista, perseguido com sanha polo ‘búnker’ neofranquista por se atrever a investigar os crimes da ditadura.

O maior sucesso do juiz patenteou-se nos ambientes mais clássicos da esquerda do Regime : nos sectores do cinema, a música e a literatura que vivem da promoçom fornecida grandes corporaçons mediáticas hispanas. Valedores habituais de causas como a defesa dos serviços públicos, o feminismo liberal, os direitos LGTB, mas calculadamente silenciosos quando se trata de denunciar as torturas ou a existência de presos e presas políticas, ou de pôr em causa a monarquia ou a indisolúvel unidade de Espanha. ‘O Tribunal Supremo pode arredar Garzón da justiça,mas à Justiça nada nem ninguém poderá arredá-la de Garzón’, manifestou numha gala dos Goya Isabel Coixet, cineasta premiada e reiteradamente enxalçada na mídia por se manifestar contra o independentismo catalám.

Coixet é autora dum apologético documentário-entrevista a Baltasar Garzón, produzido por MissWasabi Lab ; no filme, o entrevistador do súper juíz é Manuel Rivas, umha importante figura da literatura galega conhecida pola denúncia selectiva da vulneraçom de direitos. Descobridor de importantes episódios da nossa memória histórica e sensível com os atropelos contra republicanos, galeguistas e revolucionários durante a ditadura, preferiu omitir na sua exaltaçom do juiz o importante protagonismo de Garzón na ilegalizaçom de opçons políticas e nos maus tratos contra dissidentes.

Só umha habilidosa e cínica capacidade para navegar entre duas augas pode explicar a posiçom de tal grémio artístico e intelectual, que continua a abandeirar a figura do ex-juiz. O Seminário Galego de Educaçom pola Paz participou também da defesa da sua figura entregando-lhe o chamado ‘Prémio PortaPaz’. Engrossando a lista de aplausos e homenagens, cumpriria resenhar aliás que Garzón conta desde 2011 com umha Fundaçom do mesmo nome teoricamente consagrada a velar polos direitos humanos e a sua aplicaçom universal : no seu patronato aparecem nomes como Shlomo Ben Ami, Luis del Olmo Marote, José Antonio Martín Pallín, Manuel Ramiro Muñoz, ou Manuel Rivas Barros.

Nesta grande cerimónia da confusom, vozes dissidentes tentárom deitar luz sobre a verdade. No momento mais álgido da campanha apologética, coincidente com a sua inabilitaçom, a associaçom Memória contra a Tortura publicou artigos em vários jornais para expor o seu ponto de vista sobre a verdadeira natureza de Garzón. Na Catalunha, dezassete torturados na ‘Garzonada’ de 1992 publicárom umha carta em vários jornais onde relatavam os maus tratos e os vexames que o juiz nunca quijo investigar, ponhendo em causa a limpeza moral do magistrado estrela que tam bem representa a dupla moral da democracia espanhola e a falsa esquerda intelectual que a sustenta.