Adaptaçom ortográfica do Galiza Livre /

Todas as alunas e alunos estudados que entraram no sistema escolar falando galego acabaram por desistir por causa da pressom exercida contra elas/es naquele meio.

Disposto a terminar esta série de artigos dedicados a dar conta das agressons exercidas sobre alunas e alunos galegofalantes nas nossas escolas, devo revelar a fonte de informaçom que serve de base tanto a este escrito como aos dous anteriores (microespanholismos 1, e microsespanholismos 2), publicados nos últimos meses de julho e setembro. Estes som os primeiros resultados de uma pesquisa em andamento, na qual os testemunhos de inúmeros informantes som estudados em profundidade e comparados com uma observaçom direta realizada em primeira pessoa durante anos. Nom é um trabalho no que falamos de percentagens ou de evoluçons estatísticas sobre o uso da língua. Esta pesquisa vai dirigida a relatar as experiências, muitas delas terríveis, de adolescentes de fala galega em situaçom de singularidade, de descobrir as razons últimas e mais íntimas do abandono da língua galega por parte de muitos adolescentes vilegos e de revelar as desiguais relaçons de poder que se escondem por trás de cada comportamento linguístico.

Neste trabalho, por enquanto inacabado, começam a perfilar-se muitos vultos perturbadores. Em primeiro lugar, acontece que todas as alunas e alunos estudados que entraram no sistema escolar, falando galego, acabaram desistindo a causa da pressom exercida contra elas/es nesse meio. O abandono da língua galega começou em alguns deles aos nove ou dez anos, mas tornou-se mais abrupto e dramático na fase instável da primeira adolescência, por volta dos treze ou catorze anos. Um sistema escolar adornado com dias das letras e outras cerimónias linguísticas, oficialmente dedicado a dinamizar o uso do galego, provou ser incapaz de ajudar a manter a língua naqueles alunos que já o possuíam de entrada.

Um segundo perfil de alunas e alunos é o que decide mudar a língua do espanhol para o galego durante a adolescência. Trata-se de um estudantado -como nom, dadas as circunstâncias!- minoritário e medianamente ideologizado. Este estudantado também há de pagar portagens polo seu novo hábito linguístico, que vai desde o assédio mais direto e descarnado até a necessidade de adopçom de um estilo de socializaçom mais seletivo que supom o abandono de velhas amizades e a incorporaçom a novos círculos, normalmente mais reduzidos. O seu meio social nom é capaz de encaixar a sua mudança de língua cara o galego como algo normal e aproblemático.

Um terceiro grupo de adolescentes som aqueles que estam à espreita, acaçapados por trás do seu hábito de fala castelhana, mas com vontade de mudar sua língua para galego ou, polo menos, usá-lo de vez em quando com amizades. Mas vista a experiência dos mais arriscados, dos que se atreveram a dar o passo, e das reaçons que observam contra elas/es, este tipo de estudantado aguarda pacientemente até perder de vista o centro escolar para começar a falar em galego de uma maneira normal. O liceu, concebido legalmente como um espaço de respeito e tolerância, termina no plano real sendo exatamente o oposto em relaçom aos hábitos linguísticos dos estudantes, mas apenas quando o galego mostra sua cabeça.

Naturalmente, há mais perfis. Há, por exemplo, as alunas e alunos que venhem do meio rural e param de falar galego todos os dias quando saem do autocarro e entram pola cancela do liceu. E há, é claro, quem entre chanças e risos de inocente aparência ridiculiza seus colegas por serem demasiado baixos, demasiado altos ou por falarem em galego. De facto, a maior parte da pressom social que leva ao estudantado de fala galega a desistir como tal, e que obriga aos novos falantes a ter que aturar de todo o imaginável, nom vem do corpo docente, mas dos seus próprios colegas. A pressom dos pares é a que mais pode quando se trata de modelar os hábitos linguísticos.

Esqueçam-se do clássico esquema do vilego de língua castelhana, presumivelmente médio culto que fai escárnio com o falante de galego rural presumivelmente inculto. Esta situaçom é pouco registada no contexto estudado, porque o falante de galego do rural aprendeu a mimetizar-se e já nom exerce como tal quando lhe pode causar problemas. As crianças de fala galega de hoje provenhem de famílias de língua galega cultas, que falam uma variedade de padrom da nossa língua. Os intolerantes que mexem com eles tenhem geralmente uma origem social e familiar muito diferente. Hoje, os agressores linguísticos tenhem um capital cultural muito menor do que aqueles que som agredidos, e ainda assim ganham o jogo porque exercem desde uma posiçom de poder. O poder, como sabemos, nom é apenas o que retenhem as instituiçons. O poder é uma corrente que atravessa a sociedade. Qualquer um que nada a favor dela, seja rico ou pobre, tem carta de corso. Pobres dos poderosos se nom tivessem quem, de jeito consciente ou inconsciente, lhes espalhasse sua mensagem, profundamente ideologizada, em todo o corpo social.

É assim que as cousas som e isso é o que há, e há que reconhecê-lo, mesmo que doa. Lembrem: nenhuma das situaçons descritas nesta série de artigos venhem de tempos perdidos na história do pais, senom que todas ocorreram nos últimos dez anos. O mais doado seria cair em desespero, mas nós nom vamos pôr nem um pé nesse terreno. Estamos a falar de condutas adolescentes e os roles sociais nom estam definitivamente marcados. Os agressores nom fazem nada além de reproduzir acriticamente dentro da escola o que respiram fora. Agravado polo facto de serem adolescentes, o desamparo dos agredidos é o mesmo que existe para todas as pessoas falantes de galego, além de operaçons estéticas e de espaços muito específicos, em qualquer âmbito da sociedade.

Mas tudo é reversível. As agressoras de hoje podem ser as normalizadoras de manhá; há referências biográficas que assim o testemunham. A tarefa é, porém, complicada. Uma política lingüística que merecesse tal nome deveria procurar, polo menos, que uma rapariga de fala galega entrasse e saísse do sistema escolar sem ser obrigada a mudar de língua por pressom social. Para isso, como nos casos provocados pola violência verbal do tipo machista ou xenófobo, nos centros de ensino há que trabalhar sobre todo com a parte atacante. Agressoras e agressores a tempo parcial, capazes no fim das contas de mudar hábitos linguísticos nos demais, limitando severamente sua liberdade. Verdugos e vítimas a um tempo, também oprimidos como opressores; pessoas que parecem estar pedindo a berros que alguém as libere também a elas do seu papel, assim como os que andamos nestas lides aprendemos no seu dia do grande Paulo Freire.