Por Nelson Maldonado (traduçom de galizalivre) /

A descolonizaçom já nom é hoje umha referência estranha ou a processos políticos do passado. Nom lhe devemos isto só à propagaçom dos estudos poscoloniais nos Estados Unidos e América Latina, senom que vemos o termo utilizado respeito de processos políticos actuais quer nos Estados Unidos com relaçom à presença desafiante de chicanos, porto-riquenhos e migrantes de América Latina no seio da sociedade estado-unidense, quer na América Latina, por grupos de afro-descendentes e indígenas como em Ecuador, ou em Bolívia e no Brasil. O tema vai-se estendendo à França após as revoltas de argelinos e outros africanos nos subúrbios de París, na Alemanha, com o esforço de intelectuais alemáns por amostrarem o outro lado da Europa (quer a colonizadora quer aquela que se beneficiou com a interacçom com a África e a presença preta na Europa), e ainda na Rússia onde intelectuais dos antigos territórios da URSS tentam compreender a sua situaçom e as opçons actuais após a queda do império que os unia.

O mesmo se pode dizer de sujeitos em Catalunha e Palestina, que já percebérom paralelismos com populaçons racializadas fronteirizas nos Estado Unidos no caso dos primeiros, e com povos indígenas no caso dos segundos.

O tema da descolonizaçom nom atinge daquela somente populaçons marginadas nas Américas. É mais bem um tema que progressivamente adquire relevância mundial, já que a colonizaçom voltou e foi desde há muito tempo o módus operándi mesmo da globalizaçom. Mesmo se poderia dizer que o problema do século XXI há ser em gram parte o problema da colonizaçom na forma do empobrecimento contínuo de populaçons racializadas, da invasom dos seus territórios por parte dum novo imperialismo que procura virá-los peças chave no triunfo e expansom da lógica do capital em todo o mundo, e da criaçom de valados de contençom entre zonas privilegiadas e o antes denominado Terceiro Mundo -por exemplo o caso da fronteira México/Estados Unidos. Cumpre também considerarmos que a globalizaçom da cultura estado-unidense leva canda si a propagaçom do desejo por certos padrons de consumo, certa visom do sujeito extremamente individualista e consumista, igual que, como assinala Lewis Gordon, as diferentes fóbias racistas que lhe fôrom constitutivas aos Estados Unidos como naçom. Quer-se dizer, a globalizaçom segue a funcionar em parte como expansom dos ideais fanados de humanidade e subjectividade, tanto como de poder e conhecimento.

A esquerda mundial tende a entender, porém, a dinâmica imperialista como umha oposiçom entre poder hegemónico por umha banda e países periféricos por outra, é dizer, entre un bloco privilegiado e um explorado, sem perceber que o imperialismo também procede através da implantaçom de hierarquias de ser e de valor que dividem o mundo, por um lado entre brancos e sujeitos de cor no Norte, e entre diferentes tipos de mestiços e populaçons excluídas de projectos nacionais no Sul. Para pensar a complexidade da colonialidade cumpre reflectir, tal como Aníbal Quijano tem apontado, que a chamada “dependência” nom se pode explicar só a partir de forças exteriores que se imponhem a países previamente colonizados, mas também a forças interiores que mantenhem diferentes hierarquias raciais nos países em questom. Som estas hierarquias as que continuam a ser reproduzidas tanto nas formas do imperialismo actual como em projectos de nacionalizaçom baseados na hegemonia branca ou mestiça. Aliás, cumpre agregar que entre os racializados mesmos também se estabelecem hierarquias de valor, o que significa que a “diferença colonial” (Mignolo) nom só propom umha divisom epistémica entre sujeitos participantes no projecto de de colonizaçom e os colonizados, senom também umha heterogeneidade colonial hierárquica que se desenvolve de jeito diferente em diversas tesituras e momentos históricos. O esquecimento destas dimensons leva a que a crítica ao imperialismo tenda a invisibilizar a existência contínua das fortes divisons raciais no mundo previamente colonizado, e o role destas divisons em manter o carácter subordinado desses territórios na economia mundial. A crítica ao imperialismo decote tende também a marginar a dimensom prospectiva e de mudança de projectos de descolonizaçom.

Todo isto fai pensar numha proposta da feminista preta estado-unidense Patrícia Hill Collins quando assinala que embora o problema do século XX pudo ser, tal e como reclama o sociólogo afro-americano W.E.B. Du Bois, o problema da linha-de-cor, o problema do século XXI há ser tanto o problema da afirmaçom das hierarquias raciais tradicionais e da sua expansom como o da negaçom da sua existência por sectores que as enxergam como irrelevantes ou como já resoltas. Umha alternativa a este problema consistiria em investigar as formas em que as estruturas de poder modernas e posmodernas seguem a produzir a divisom entre amos e escravos das que fala Frantz Fanon, ao tempo que mantenhem e espalham divisons raciais tanto no próprio interior do espaço dos colonizadores como dos colonizados. Muito vinculadas e emparentadas com as divisons raciais também se encontram as formas fundamentais de diferenciaçom hierárquica como as de género e sexualidade. Umha teoria crítica hoje deveria iluminar e fornecer saídas diante desta realidade complexa. Este tipo de teoria é a que melhor havia responder às exigências de povos como o de Bolívia ou de sectores no povo chicano e latino nos Estados-Unidos, por citar só dous grupos que se encontram ou há pouco que se encontrárom na primeira plana (os latinos depois das marchas mais numerosas na história dos EEUU a prol dos direitos dos migrantes) por proporem desafios descolonizadores nos que tanto o Estado como a economia e a educaçom estám envoltos. A consciência sobre a relevância e a urgência desta angueira é o que chamamos hoje viragem des-colonial.